O Guardião e o Casamento na Ilha Mágica
A noite em São Luís estava encantada, como só poderia ser em uma terra que respira poesia e misticismo. Era o casamento do ministro Flávio Dino, e, entre taças tilintando e risos que ecoavam pelo salão, ele estava lá: Alexandre de Moraes. O homem do STF, o terror da extrema direita e, naquela noite, um refém informal da plateia de admiradores.
Sentei-me a poucos metros da sua mesa, sob a sombra dos lustres de cristal e o olhar da noiva radiante. Ele tentava – em vão – provar um gole de seu drink. Um Aperol, talvez? Não importa. Cada tentativa de levar o copo à boca era interceptada por alguém munido de um celular e um sorriso nervoso. Os pedidos variavam: “Só uma foto, ministro!”, “Dá pra fazer uma selfie?”, “Só dois minutos da sua atenção!” Alexandre, sempre polido, retribuía o assédio com um sorriso cortês, embora eu apostasse que o drink já estivesse morninho.
Eu não me atrevi. O fantasma de uma história antiga me assombrava. Lembrei-me do amigo que, tomado por um entusiasmo irracional, aproximou-se de Sérgio Moro em um restaurante com a família. O encontro se transformou em uma memória traumática – ele ainda revira os olhos ao contar como a interação foi seca e constrangedora. “Nunca mais, jamais!”, repete ele, entre goles de vinho e recriminações autoinfligidas.
Mas no meu caso, não foi só a prudência que me segurou. Eu sou do time dos antisociais – aqueles que, na dúvida entre abordar alguém e continuar contemplando em silêncio, escolhem sempre a última opção. Preferi observar Alexandre de Moraes de longe e imaginar os pensamentos que corriam por trás daquela careca reluzente. Afinal, que homem comum carrega nas costas o peso de prender um tenente-coronel aqui, desmantelar uma milícia digital ali e ainda encontrar tempo para sorrir pacientemente em um casamento?
Sua missão, como Muniz Sodré nos alertou, é algo tão visceral quanto nobre: proteger a democracia brasileira de uma conspiração tecida às claras, num espetáculo tragicômico de mensagens cifradas e tanques desmoralizados. Se Moraes é a face impávida que corta esse teatro com prisões preventivas, então, ali, no casamento, ele era apenas um homem tentando sobreviver a uma noite de gentilezas excessivas.
No fim, deixei a festa sem falar com ele. Enquanto caminhava pela rua de paralelepípedos de São Luís, pensei em como Alexandre de Moraes talvez não pudesse se dar ao luxo de ser somente um convidado discreto. Ele, com sua gravidade institucional, está condenado a ser sempre uma figura pública – um guardião que não pode baixar a guarda nem em uma noite de festa.
E talvez seja por isso que, ao terminar seu drink, ele ainda estava lá, imóvel e sereno, sorrindo para mais uma selfie. É difícil ser um homem comum quando o país inteiro o observa, mesmo que o peso do mundo descanse, por uma noite, sobre os ombros de outro ministro, o noivo.
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