O Paredão do Apocalipse !

O Paredão do Apocalipse


Ah, o Maranhão, terra de sol, maranhenses simpáticos e… o paredão de som. Se você acha que o apocalipse será uma saraivada de meteoros, engano seu: ele já acontece nos fins de semana maranhenses, embalado por um tsunami de decibéis e, claro, sem a menor preocupação com tímpanos ou com o conceito básico de convivência civilizada.


Vejamos a cena: um humilde veículo, que deveria se preocupar apenas em conduzir seu dono pelas estradas esburacadas e em sobreviver ao trânsito local – onde o cinto de segurança é artigo de ficção científica e a ultrapassagem pela direita é celebrada como manobra olímpica. Mas não. O pobre carro é brutalmente transformado numa aberração acústica, uma espécie de Frankenstein automotivo, carregando uma prateleira vertical de caixas de som capaz de intimidar até uma rave em Ibiza.


A lógica do paredão é cristalina: quanto maior o som, maior o ego do dono. Parece que o Maranhão inventou a versão sonora do “quem tem a maior”. O comando remoto, que seria a tecnologia do futuro em mãos sensatas, aqui é a chave da discórdia: com um toque, o som é jogado às alturas. Não importa se ao lado tem uma criança chorando, um idoso tentando lembrar como era a paz ou um convalescente que só queria uma cochilada. O universo do paredão não é para amadores – é para barulhentos profissionais.


Claro, vem sempre a ladainha do “respeita o gosto dos outros”. Mas, convenhamos, quem vive nesse calvário sonoro sabe que o gosto musical de quem adere ao paredão é tão sofisticado quanto o churrasquinho de gato da praça: barato, fácil de digerir, mas indigesto para quem tem estômago – ou ouvidos.


E a música? Ah, essa merece um simpósio. Não vamos tratar dela aqui porque seria injusto com outros gêneros musicais que, mesmo ruins, pelo menos não exigem a intervenção de fonoaudiólogos. O paredão não é sobre música; é sobre a performance de ser insuportável, o balé de um ego inflado sobre rodas.


E o que fazer? Talvez possamos, como último recurso, disseminar pelo Maranhão o evangelho do easy listening, o charme elegante de um Tony Bennett ou o relaxamento de uma boa lounge music. Quem sabe, num futuro utópico, essas almas ruidosas percebam que a verdadeira potência não está no alto-falante, mas no silêncio compartilhado.


Até lá, sigo aqui, sonhando com uma Terra onde o único som alto seja o aplauso de um público entusiasmado – e não a bagaceira de um paredão que parece ter saído das profundezas do inferno.


E que Deus tenha piedade dos nossos ouvidos.


Nello Morlotti


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