Café com Chacrinha !

Crônica – Café com Chacrinha Literário

Ruy Castro já disse e repito: faltam livrarias. Mas eu acrescento: também não adianta encher a cidade de livrarias se o que vai pra vitrine é o equivalente literário de um “café com Chacrinha”.


Livraria é templo, mas andam transformando em fast food do papel. Hoje, quando aparece uma prateleira fresca, não tem Joyce Carol Oates nem Lima Barreto. O que tem? Tem livro de colorir para adultos entediados. Tem o manual definitivo de como ficar rico em sete passos — escrito por um sujeito que só enriqueceu vendendo o próprio manual. Tem autoajuda com frases de Instagram — “seja foda!”, “acorde às 5h!”, “sorria mais!” — tudo embrulhado em capa dura, porque capa dura dá autoridade, mesmo que o conteúdo seja mole.


As bibliotecas, essas sim, fazem falta. Elas ensinavam que livro não é mercadoria pra virar estoque de shopping, mas um bem público, um lugar de descoberta gratuita. Onde mais um garoto pobre poderia topar com Machado de Assis sem precisar ouvir palestra motivacional antes? Hoje, sem bibliotecas, sobra o “mercado” pra decidir o que a gente lê. E o mercado tem mau gosto: prefere planilhas de investimento para obtusos e “sabedorias” de coach em letras garrafais.


É triste notar que, quando a farmácia substitui a livraria, perdemos espaço físico; mas quando a autoajuda substitui a literatura, perdemos espaço mental. Um comprimido a menos, tudo bem. Um parágrafo a menos, nunca.


A esperança? Talvez esteja naquelas três mulheres que abriram uma Janela em Laranjeiras. Mas que essa janela não dê apenas para as estantes de “Como ser feliz em trinta dias”. Que abra para Cecília, Lima, Ana Maria Gonçalves. Que abra, sobretudo, para o silêncio de uma biblioteca — aquele silêncio que ensina mais que dez mil coaches.


Nello Morlotti



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